“E eu trabalho: penso, escrevo,
invento, na Poesia,
crio histórias para os outros,
espalho alguma alegria,
espanto a treva do Mundo
que em meu sangue se alumia
dou beleza ao crime e ao choro...
É pouco, mas tem valia! “
Ariano Suassuna
Foram 78
anos. Nascido na Paraíba, de família humilde e de poucas posses, sem tempo e
recursos para sentar em bancos de escola, cedo Luciano Carneiro de Lima descobriu
que eram muitas as amarras que lhe prendiam ao chão. E, prematuramente, idealizou: só a Arte tinha os poderes de
lhe proporcionar asas e brevê de voo. Viu,
ainda menino , como Patativa, “um diluve
de rima /caindo pro riba da terra”. Aos 16 anos, adotou o Crato como sua terra,
certidão do novo nascimento que anos depois teria a firma reconhecida pela
Câmara Municipal . A busca pelo pão diário levou-o trabalhar como
carroceiro, agricultor, vigia, mas seus olhos fitavam ao longe o manjar do
espírito. A poesia terminou por preencher toda a larga mesa que convidava a
todos para os banquetes e saraus
das divas e de Dionísio. Como ele mesmo profetizara:
“Eu não tive vocação / Pra diácono nem
vigário / Tornei-me então um poeta
Não muito extraordinário / Mas sou com muita alegria / No campo da poesia
Um verdadeiro operário”
Não muito extraordinário / Mas sou com muita alegria / No campo da poesia
Um verdadeiro operário”
Meia
centena de cordéis publicados, incontáveis poemas recitados com os recursos
teatrais da oralidade, Luciano carregava consigo os segredos mais íntimos da
poesia: a linguagem escorreita, o humor fino e dosado, a forte temática social,
a fina ironia e a rima solta e , de tão
natural, quase necessária e imperceptível. O reconhecimento do seu povo fluiu
tão espontânea como seu verso: tornou-se Mestre da Cultura Popular do Ceará em
2008, fez-se um dos fundadores da Academia dos Cordelistas do Crato ( 1991) e
ocupava a Cadeira Número 3, da Seção Folclore , do nosso Instituto Cultural do
Cariri, sob a proteção do icônico Mestre Elói Teles. O Mestre amava tanto as
musas do Olimpo como as terrestres e junto com os versos deixa sobre a terra
treze filhos e uma chusma de netos e bisnetos.
Nestes
últimos dias, nosso Luciano, a contragosto, aprendeu que Poesia e Alegria rimam
também com Agonia e Pandemia. Hoje, partiu na viagem de volta. Deixou , como o
cometa que ora cruza os céus, seu rastro luminoso no nosso horizonte. Ficam
seus versos, seu olhar poético para um mundo cada vez mais cartesiano e a
certeza de que por mais fortes e tenebrosos que sejam os grilhões sempre é possível
alçar voo com as asas da Arte ! “Espantou aquela treva do mundo , que no seu
sangue se alumia ! Deu beleza ao crime e ao choro ! É pouco ? Mas tem Valia !”
Instituto Cultural do Cariri
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