As perdas são sempre difíceis de se digerir porque, de alguma maneira, se fazem a antevisão da nossa partida e a dolorosa certeza da impermanência. Quando parte , então, um artista da tradição, a tristeza queima-nos como uma brasa ardente. É que eles não partem sozinhos : levam consigo um pedaço expressivo da nossa história, incineram livros importantes da biblioteca de nossas vidas. É como se , de repente, nos batesse uma orfandade atávica. Quem dançará conosco , agora, a ciranda ? Com quem ficou aquele pedaço de refrão que nos batia , como um mantra, nos ouvidos, desde a infância ? Quem tecerá conosco os fios do Trancelim ? Quem executará agora o pas-de-deux, se ficamos sós no meio do tablado ? O encantamento do mestre Raimundo desaba sobre nós com a sensação de que pereceu o último soldadinho da chapada, que tombou a última timbaúba no sopé da serra. Mas a vida continua a desdobrar-se sob os sons agora distantes do seu pífaro, os meneios em carrossel do seu gingado. Como numa gigantesca Troça Carnavalesca, trocam-se os passistas, muda-se o porta-estandarte mas a festa deve continuar inebriante e vívida como uma reverência ao seu legado e a certeza de que viverá absoluto enquanto continuar o Corso nas ciclicidades das estações da existência. O Grande Mestre Raimundo está vivo !
Foto - Samuk
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